Acho que é vivendo a vida que vamos percebendo que somos nada, esse puro e divino pedaço de nada que com nenhuma presença honra ou desonra, que martiriza-se e glorifica-se ao ocupar esse papel que é o de ser, de ser o nada. Talvez nesse mundo inteiro não haja sequer uma coisa que seja algo que não nada; talvez as ramificações dos troncos das árvores, o amor, as penas que caem dos pássaros, o oxigênio dos nossos pulmões, as nuvens, as lágrimas, o papel, o gozo, o efeito estufa, tudo não passe de uma ilusão de vida, um protótipo de realidade de alguém que não existe criou para se entreter. Essas palavras que escrevo e que você lê, as músicas que já escutamos e as que ainda vamos escutar, a tela do computador que fitamos nesse instante e mesmo os nossos olhos, talvez eles sejam apenas (mas por que digo "apenas", se ser alguma coisa já é tanto num mundo onde o próprio ser soa impraticável?) apenas uma névoa esbranquiçada, ou até transparente (invisível), que fagocita-se até virar o nada - mesmo que houvesse sido o nada desde os primórdios. E talvez todos os nós que eu dê em sua cabeça e que desatam-se na minha de tão compreensíveis também ocupem nada, sejam inúteis e tão desprezíveis quanto as nossas existências vãs que tentam loucamente se justificar, negando absorver a teoria mais simples, de que somos o nada mesmo, e evitando constatar que, admitindo ser o nada, nos tornamos mais leves e perdemos as pretensões de ser alguma coisa - qualquer uma. Pense no vazio mais completo, supere características barrocas da efemeridade da vida, concentre-se em imaginar algo tão vazio que chegue a ser imaginável, por ser menos que um tênue fio de lã, menos que uma molécula, que a brisa da manhã, que a brancura do que é branco, e que por ser branco é tão somente nada. Imagine e pense que você é isso que está vendo (o nada), e que todos também o são, e que o mundo não passa disso, podendo nem ao menos ser comparado com uma casca de noz, como já fizera o grande Stephen Hawking. Assim, tendo ideia do que somos, e sendo o nada, não iremos mais perder tempo nos questionando, iremos deixar que o nada nos domine e nos seja, para que assim possamos viver nossas vidas sendo quem somos no fundo da nossa essência, transbordando um pouco da vitalidade e da individualidade que é tão pessoal e que só pode ser alcançada no auge da interpretação do nosso papel principal, que é esse de sermos nós mesmos com a naturalidade e selvageria sugerida por Rosseau lá no iluminismo. E todas essas preocupações que usamos para fartar nossas cabeças, todos os valores e brigas e gritos e cigarros beijos e cheiros, tudo isso se resuma a uma perda de tempo, que na verdade é irreal, já que somos o nada e o nada não pode perder tempo porque não é mimoseado com posses. Posses estas, as casas, os carros, o dinheiro e - ah, que dó! os livros, os vinis de Chopin, as cartas de Napoleão, os poemas de Gregório - jamais tenham pertencidos e jamais serão posses de alguém que não de si mesmos e da própria rede de inexistência. Mas o que quero dizer mesmo é:
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Fascinante;simples assim.De um jeito talvez triste ou até mesmo feliz,mas fascinante.Parabéns pelo texto! Talvez como o seu texto esse meu comentário seja "nada",mas gostaria muito de compartilhar que me encantei pela sua forma de escrita e pelo seu lindo/triste modo de expressar um pensamento.Continue assim...meus parabéns novamente.
ResponderExcluirE se te dissesse que seu texto é um magnífico resumo de tudo que já pensei e considerei de nossa essência, como meros "nada"? E quem sabe estas aspas tenham sido um equívoco. Não ouso chamar de nada, minha ignorância só estende-se ao ponto de considerar o seu nada no meu desconhecido, pois "nada" é apenas, para mim, uma adjetivação do conhecimento do homem. Gosto de pensar que somos uma célula, uma pequena parte de um ser inimaginavelmente titânico, do qual nossas mentes não são capazes de quantificar e, tampouco, compreender. Quanto ao seu texto, mais um incrível, com uma visão muito além do padrão. Meus parabéns, continue assim, existe algo que posso afirmar que "nada" não é, sua inteligência.
ResponderExcluirO.E., queria tanto saber quem você é. Sinto-me tão grata e tão feliz com suas palavras que uma lágrima ousou escorrer pelo meu rosto, tamanha alegria que subitamente tomou meu coração. "Obrigada" parece pequeno se usado pra exprimir o que sinto agora; mas, obrigada. Obrigada do fundo do meu coração, e volte sempre, pois é um prazer ter um leitor (ou uma leitora) como você aqui, capaz de dialogar com minhas entrelinhas e de entender a essência de meus textos. Um abraço imenso.
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